Luto em Paz


De imperfeito o meu pretérito
Cabe numa poesia
Há de contar sem nostalgia
A circunstância desse mérito

Com denso teor de angústia
Faço verdade a cada verso
Num acúmulo em que imerso
Um passado de alegoria

A história que lhe conto
Vem de um santo indigesto
Vem de um canto sem manifesto
Vem da memória que em mim desconto

Tantos foram os caminhos
Que de longe planejamos
Mas por fora caminhamos

Tantas luzes acendemos
Tantas sombras escondemos
Tanto nos distanciamos

Sem que a dor da despedida
Valha mais que o nosso alívio
Já mergulho num dilúvio
Minha lamúria expedida

Sinto o mal ser tão apenas
Uma ruim recordação
Que de mim foi tão pequena
Quem de nós tem a razão?

Sinto a luz chegar tão plena
Esclarecer a escuridão
Desvendar o que houve em cena
Iluminar um drama em vão

Quem de nós tem mesmo a culpa
Se ela em si é uma ilusão?
A verdade é que houve luta
No que era pra ser paixão

E hoje vivemos em luto
Após essa conclusão.

Vera Cruz


Sua calmaria que me acolhe
E ao fim de tarde assisto em pé
Vai muito além dessa maré
Além do céu que nos engole

Se me deito em suas águas
Que mesmo rasas aprofundam
Os sentimentos me inundam
E sobrepõem o que estiver

Cada dia sua vista muda
E feito folha de arruda
Me remedia a dor profunda
Sem nem cobrar da minha fé

Queria eu só mais um banho
Que me acolha em sua maré
Que me engula com seu sol
E me leve pra onde quiser

Queria mais um banho só
Nesse lugar que sei de cor
Cada caminho e cada canto

Faria jus à calmaria
Que me acolhe e anestesia
O ardor desse meu pranto

Com sua vista em demasia
Me renovo aos seus encantos
Com sua leve correnteza
Dispo a minha natureza

Pois sua beleza é poesia
E na leveza que me guia
Ó Baía de Todos os Santos
Faz de mim uma fortaleza