Humanos Líquidos

A ideia de que o ser humano adulto, por sua idade, concretiza a própria personalidade a partir do molde juvenil é incorreta, burra mentira. O homem é uma peça líquida que desenvolve sua ideologia a cada momento, mesmo que haja conceitos presos eles sempre estarão susceptíveis à mudança - que na maioria das vezes é inconsciente.

O que faz a infância se tornar o principal momento de educação do ser humano é simplesmente a vasta ignorância. Quando sabemos pouco sobre algo sempre estaremos vulneráveis às primeiras ideias oferecidas sobre este algo. Isto é facilmente compreendido quando tomamos como exemplo um cabra do sertão ignorante do contexto urbano que acaba por se assemelhar a uma criança quando frequenta a capital, vulnerável a qualquer explicação simples do que ainda não sabe.

A obviedade desta conclusão se fará clara a medida que abrirmos nossos olhares para os ajustes que fazemos conosco quando acontecem determinadas ocasiões, capazes de moldar o nosso estilo de vida. Mas não se preocupe se pouco perceber tais mudanças, pois, como disse anteriormente, muitas vezes elas são inconscientes e, infelizmente ou não, temos controle apenas de nossos atos, mas não de nosso psiquê.

A Nostalgia me fascina

A nostalgia me fascina. Não que seja importante ou necessária, mas por ser tão carregada de emoções, sejam elas boas, ruins ou vagas. E digo vago porque, tenho certeza, existem emoções vagas. Para mim, quando uma emoção não parece ser boa nem ruim, ela é simplesmente eloquente: expressiva pela natureza de despertar em nós uma sensação diferente do comum, sem trazer felicidade ou tristeza, mas simplesmente um sentimento estranho - como a descoberta de uma resposta para aquela antiga pergunta que já veio a nos perturbar e, hoje, sua resposta apenas traduz um momento de "olha, era isso!".

Nostalgia é isso, e um pouco mais. Não é somente aquela boa ou má lembrança, mas também aquela memória vaga de uma peça de quebra-cabeça que lhe faltava. Li alguns textos e alguns falam sobre a sensação nostálgica ser perigosa. Para tal acredito que sim, quando medida sob experiências extremas, como uma perda grandiosa a qual ocasionou um chato sentimento de vazio. Porém, quando medida sob experiências mornas e interessantes, a nostalgia se torna construtiva, nos desenvolve e nos prepara para o que vier pela frente. Até porque, com quebras-cabeça montados podemos definir melhor o que somos, por que viemos e para onde vamos. Através da nostalgia trazemos fontes esquecidas para preencherem o vazio de nosso presente dúbio e completá-lo com informações deixadas em nosso inconsciente.

Memorizar é viver, pois vivemos pelas lembranças. Por mais difícil que possamos compreender, o futuro não existe. Há, em nossas vidas, somente o passado e o presente. O futuro se caracteriza apenas como um plano imaginário. Já o passado se traduz como um fato, uma situação concretizada, este sim é digno de conhecimento, pois como diz o ditado: o futuro a deus pertence (apesar de não acreditá-lo, e, talvez, por isso mesmo acreditar na expressão). E o ponto em que temos a chance de transformar nosso imaginário em concretização é justamente o presente.

Porém, ao contrário do que muitos pensam, o presente não é um espaço de tempo, e sim um ponto único, sem comprimento. Neste momento em que vou escrevendo as palavras, por exemplo, estou automaticamente levando o ponto do presente a criar uma linha de passado, e ela é contínua (como Cazuza diz: o tempo não pára). Da mesma forma, você que está lendo move o seu ponto presente criando uma linha de pretérito. A questão é que nosso cérebro é incapacitado para guardar sob o consciente toda a extensão desta linha concretizada do passado e, por isso, pega apenas "pedaços" da corda para implantá-lo em nossa consciência. O resto da corda fica embolado, dentro de nossa cabeça, apenas esperando o momento de ser finalmente resgatado para mumificar os nossos atos - e é aí que entra a nostalgia.

A nostalgia, portanto, é um ótimo meio psíquico que temos para laçar cordas esquecidas a fim de amarrar o atual consciente e poder puxar para si a verdade de nosso futuro. É assim que vamos completando o quebra-cabeça e, pouco a pouco, definindo uma imagem a qual nos dirá a resposta de nossa dúvida. Devemos sim pensar no futuro, planejá-lo. Contudo, para planejar o que vem pela frente é preciso compreender o que houve no passado. Antes da expiração sempre haverá a inspiração. E as melhores expirações vêm de um repertório bem inspirado.

O que vos digo, enfim, é base do processo criativo. É a explicação do porque os criativos são, em sua maioria, emotivos: justamente porque são aqueles que buscam inspiração para transformá-la em ideia. São quem busca perguntas antes mesmo de procurar respostas. São simplesmente nostálgicos, porque (uns nem sabem) transformam fios embolados, cheios de nós, em linhas - a partir de laços de memória unidos com os laços do presente. São quem carrega o fardo de lembrar do que não mais existe para dar luz a um novo mundo, seja de si próprio ou de todos outros. São, em sua maioria, diferentes da maioria, pois para eles os hábitos da massa são apenas consequências - o bolo da sociedade é feito de ingredientes, e eles são tais ingredientes. São quem move a humanidade a novas ideias, novos caminhos, novas ideologias.

E é por isso, meus amigos, que a nostalgia me fascina.

Dois Somos Um (Dois)

Arde o peito quando um desejo
Vem ao seu leito entregar-se à paixão
Tal como uma esfera de luz se libera
Novamente ao seu corpo explodindo emoção

A leveza de um livre e límpido beijo
Mostra-se quente por dentro da gente
Quando conhecemos a nossa união
Verdadeira posse do fruto paixão

A certeza de um futuro não precisa ser lida
Pois conforme o destino seguiremos então
Livres em conjunto na fé de estar junto
Sem corda, só ritmo de prazer e gratidão

O apego é forte, mas não combate à posse
O melhor se faz com nossa asa aberta
Hoje lhe pego, lhe vejo e desejo
Um contínuo laço com paz em oferta

Não existe união baseada em diferença
Acaba adquirindo a indiferença incerta
Daí a tristeza corrói falsos sentimentos
Destrói todo o apego do relacionamento

Mas a relação que se faz à base do igual
Será ideal pelo fato da semelhança
Que nos calça de amor, liberdade e esperança
Justo por partilhamos boas lembranças

Sou muito feliz por lhe ter afinal
Igual como eu, só existe você
Que o nosso prazer seja imortal
Porque sempre me encanto ao lhe reconhecer

Preste a Saber (Música)

Há um tempo você me pediu
Para entrar na luta
Como se houvesse fim
E o fim dissesse a mim
Que venci

Fecho os olhos pra esquecer
Se à minha frente está você
Quem diria sucumbir
Neste chão frio

Abro a mente pra entender
Se é a gente então pra quê
Dizer que estive aqui
À margem do rio

Preste a saber
Se a dúvida lhe envolver
Estou por si
Como está por mim

Preste a saber
Se a dúvida lhe faz crer
Já resolvi
Lhe explicar o porquê
Não estou aqui

Enquanto muitos olham para cima
Eu só olho pra você.

Sangue Frio

Queria ter sangue frio
Para dizer-me que sou forte
Salgar a morte com desprezo
Enriquecendo sem perdão

Queria ter sangue frio
Para esquecer qualquer desejo
Não chorar com qualquer corte
Selar a dor pela razão

Queria ter sangue frio
Pra não arder o meu lamento
Ao simplório sentimento
de mágoa, pena ou solidão

Queria ter sangue frio
Pra congelar minha emoção
E concentrar-me no vazio
De uma história sem paixão

Queria ter sangue frio
Porque o quente me destrói
Me amargura de rancor
Me enfraquece de amor

Me despedaça o coração.

Não Permita

Dê-me pouco pra viver
Ou viva sempre sem saber
O que me resta a dizer
Não cabe a mim lhe responder
Mas tente ao menos compreender
Se o infinito vai trazer
O imortal do seu prazer
Ao se fundir quando me ver
Ou separar o que há pra ser
Sem me zelar e me perder
O que ficar não vai morrer
Mas não terá como fazer
Continuar o nosso amor
Que se destrói pelo rancor
Ao construir a nova dor
Que me separa de você

Ao saturar a nossa cor
Com o neutro do mal querer.